aquela rapidinha. tem gente que até prefere assim.
o Fail é uma lista incoerente, que retoma temas que me perseguem, na qual você pode encontrar algo talvez útil, talvez interessante.
nesta semana, não temos newsletter por motivo de: agenda frenética, frila atrasado, castrar cachorra, computador com problema na tela e contando.
este é o amontoado do fracasso da última semana.
*
1.
Na última edição, a indignação de cronista lacradora falou mais alto. Posso ter sido genérica, mas estava hablando sobre o universo heteronormativo. Pessoas LGBTQIA+ usualmente também têm uma relação diferente com o teto de painho e mainha; muitíssimas delas, aliás, são colocados para fora de casa, como bem se sabe.
Um tópico que queria ter pincelado mas passei direto era o da relação entre gênero e arquitetura. Deixo aqui o artigo de Fernanda Bueno Galloni como sugestão de leitura. E destaco abaixo dois fragmentos desse mesmo texto.
Se na Europa, após a Primeira Guerra Mundial, o déficit habitacional impulsionou uma revisão dos padrões de moradia por meio da construção de habitações com uma redução significativa na média de metros quadrados por apartamento (COSTA, 2018 apud GALLONI, 2021, p.28), essas escolhas práticas também evidenciaram os principais valores sociais, culturais e morais ali vigentes. Frente às limitações de espaço, foi tarefa de profissionais da arquitetura projetar ambientes que permitissem a perpetuação de um sistema social carregado por implicações de raça, classe, gênero e sexualidade.
Para os alemães, uma cozinha altamente funcional e racionalizada foi considerada uma prioridade. A Cozinha de Frankfurt, desenhada por Margarette Schutte-Lihotzky em 1926, foi concebida com o objetivo de englobar, no menor espaço possível, todos os serviços relativos ao cuidado com a casa. Ainda que emblemática por ter sido projetada por e para mulheres com o objetivo de facilitar as tarefas domésticas, esse tipo de design evidencia alguns dos papéis e hierarquias que regiam a organização social do período: o trabalho doméstico deveria ser realizado por apenas uma pessoa (não é uma tarefa que possa ser compartilhada) e a pessoa responsável seria uma mulher (TORRE, 2020 apud GALLONI, 2021, p. 930)
Em oposição à compreensão de que as tarefas domésticas deveriam ser realizadas dentro da esfera privada, para a população russa, após a revolução de 1917, as experiências de reformulação do lar coletivizaram a maior parte dos espaços que compunham a tipologia residencial, como a cozinha, a lavandeira, a sala de visitas e por vezes o banheiro.
No texto “Remaking the Bed: Utopia in Daily Life” (1996), a pesquisadora Olga Matich descreve o conceito “Novyi Byt” (novas formas de domesticidade), promovido por membros da Lef (jornal promovido pela frente esquerdista de artes). A fim de reformar a vida cotidiana e baseados na rearticulação dos limites entre público e privado, propôs-se que os novos núcleos domésticos fossem desatrelados dos valores burgueses de família e domesticidade. A família biológica, assim como a monogamia e a divisão sexual do trabalho, seria dissolvida, e as tarefas domésticas e maternidade tornar-se-iam responsabilidade do estado.
O poder público financiou as Kommunalkis, - apartamentos comunais compartilhados por diferentes famílias - e conjuntos habitacionais como o Narkomfin, complexo residencial composto por pequenos apartamentos que podiam usufruir de programas comunitários como cozinhas e salas de jantar coletivas, lavanderia e jardim de infância. (LUCARELLI, 2016).
Autonomia, casa, gênero, família, autonomia. É possível reimaginar o viver. E, ainda no rastro da última edição, é necessário virar adulto. Juro que é mais do que ressentimento de solteirona. É que pessoas adultas têm mais condições de promover alguma saúde social.
2.
Qual a porta de entrada que você escolheu para ajudar o Rio Grande do Sul? Dividindo a que escolhi para quem ainda pode e quer contribuir.
Os efeitos dessa tragédia seguirão por meses, e meses, e meses.
3.
Por falar em desastres ambientais e fim do mundo, topei com a discussão sobre os usos retóricos que a extrema-direita do Norte global tem feito da causa ambientalista. Em termos planetários, nem só de agrocapiroto interessado em hectares infinitos de soja vive o conservadorismo.
Existem outros capirotos.
O termo ecofascismo já não é novo. Só que a tendência agora é a pregação de medidas ecológicas misturadas ao puro suco da xenofobia, associando os imigrantes e os movimentos migratórios aos desastres e desequilíbrio do meio ambiente.
A turma que trouxe todo tipo de doença e explorou <e segue explorando!> até onde não deu mais os recursos naturais de outros continentes agora tá achando muito chato que a conta da bagunça do progresso chegue aos Alpes Suíços. Conservadorismo carpe diem.
Para quem lê em inglês, este artigo explica o conceito de ecobordering. Haja chorume para aguentar até que o mundo brancocidental realmente acabe.
4.
Tem um debate bom sobre arte e ecologia acontecendo nos últimos tempos em um dos cantinhos com mais ranço colonial da cidade do Recife: as terras tradicionalmente vinculadas à família Brennand.
Tenho trabalhado em alguns projetos editoriais junto às gerências Artística e Educativa da Oficina Francisco Brennand, com profissionais como Olívia Mindêlo, Ariana Nuala, Rita Vênus, Henrique Falcão e tantes outres, e está sendo gostoso ver tantas e tantas torções teóricas sendo promovidas no coração de um significativo império cultural do Nordeste.
No próximo dia 11 de junho, acontece o lançamento do livro No labirinto do sonho, sobre os 50 anos da Oficina, no qual atuei na edição ao lado de grande elenco. E o breve ensaio de Tiganá Santana sobre o ofá foi das coisas mais lindas que já tive oportunidade de editar nesta minha breve vida.
5.
O ofá que é de Oxossi. Mas, em termos de século XX, tempo em que o gênio individual do artista moderno bem posicionado socialmente chegava antes, para tantos e tantos, o ofá era o símbolo de Brennand.
O símbolo que Brennand pegou emprestado de Oxossi. Embora nem sempre isso tenha sido esclarecido, enfatizado.
6.
Semana passada eu assisti ao espetáculo Herança, que tem direção da genial Grace Passô e comemora os 50 anos de carreira de Maurício Tizumba. Chorei pensando nas cristaleiras que meu bisa fez e que não consegui reaver.
Da sua marcenaria sofisticada, guardo uma mesinha e a moldura que fez para a foto de sua mãe, minha trisavó.
7.
Sergio Pererê é um espetáculo à parte no espetáculo Herança.
E aqui ele canta Odé.
Odé é caçador.
Odé é Oxossi.
A quem pertence o ofá.
8.
De acordo com os antropólogos, essa tendência está enraizada em sua ideia de morte. A alma dos guarayos, para chegar ao avô, como eles identificam seu deus, deve cantar e tocar a tacuara, ou flauta de bambu, explica o historiador indígena de Urubichá, Juan Urañavi. A alma monta em um jacaré a caminho do encontro com o avô, mas se ele não souber tocar bem a tacuara, "por causa de algum descuido em sua vida", o jacaré o derruba no rio para devorá-lo, acrescenta.
A narrativa acima integra a tradição do povo de Urubichá, um vilarejo da Amazônia boliviana. A tendência a que o jornalista se refere é a de serem hábeis músicos e artesãos de instrumentos musicais. Dá para ler essa reportagem sobre os luthiers indígenas clicando aqui.
9.
Por falar em morte, começa muito muito em breve o grupo de estudos e práticas meditativas do livro Como vivemos é como morremos, de Pema Chödrön. É no espaço onde trabalha a minha amiga genial Lia Beltrão, praticante do budismo há mais de 15 anos. Ela vai conduzir o grupo em parceria com outros profissionais d’O lugar.
meu muitííííííssimo obrigada!!!!!111111
aos assinantes pagos desta newsletter:
poliana castro, mário fellipe firmino, raquel galvão, rafael moura de andrade, luiza dantas, isabel cutrim & ingrid melo.
creiam, vocês mantêm esta newsletter vivona.
sem vocês, talvez eu já tivesse escanteado a EFL.
10.
Despeço-me com a mais novíssima edgar-pedrada. Só uma faixa não tem aquele é-zinho de explícito.
10.1
Mais um link, porque vai que alguém ainda não chegou em quatro anos atrás.
10.2
Eu não acredito em pessoas que começam as suas frases com a palavra eu. Era isso que João Cabral estava tentando dizer naquele monte de ensaio.